E, no entanto, nos temem

Professor, falta dinheiro, falta reconhecimento, por vezes, ânimo até, mas tua aula ainda mete medo nos poderosos. 

Socrates

De tempos para cá, os professores voltamos a ser temidos. Temem que desencaminhemos a juventude da rota certa que a conduz mansamente ao matadouro. Fim de quem ama e angústia de quem vive. Escaparíamos nós mesmo dela, se tivéssemos tal poder.

Exigem de nós uma educação asséptica e isenta de qualquer viés. Querem-nos inumamos serviçais do status quo. A escola não mais como laboratório de experimentações para a vida, mas como campo de adestramento.

Ameaçam fazer-nos tragar a amarga tigela de cicuta – condenação dos que semeiam a dúvida sistemática como forma de construir convicções. Necessariamente temporárias. Sócrates a bebeu.

Tolos.

Basta que se ensine a pensar. A revolução é consequência. Tanto quanto a colheita é consequência da semeadura. E para ambas não há garantias.

Mas há esperança. Tudo valerá a pena, se a alma não for pequena.

Professor há tantos anos, sempre soube o que ensinei, jamais saberei o que os alunos aprenderam. Cumpri minha missão, se aprenderam a aprender.

Essa é a regra. No caso abaixo, um colega ministrou uma aula de geometria, mas o aluno aprendeu poesia:

“Às folhas tantas do livro matemático, um Quociente apaixonou-se
um dia doidamente por uma Incógnita. Olhou-a com seu olhar inumerável
e viu-a do ápice à base uma figura ímpar; olhos romboides, boca trapezoide, corpo retangular, seios esferoides. Fez da sua uma vida paralela à dela até que se encontraram no infinito. E assim, se amaram
ao quadrado da velocidade da luz numa sexta potenciação traçando
ao sabor do momento e da paixão retas, curvas, círculos e linhas senoidais, nos jardins da quarta dimensão”.

Extratos de Poesia Matemática de Millor Fernandes.

Para quem desejar o poema completo: Poesia Matemática.

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