Operação Quimera

Imagine um grave crime cometido por Lula. Então, convença-se de que ele realmente o cometeu. Basta agora condená-lo. Simples assim.

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Sexta-feira, 04 de março de 2016, a Lava Jato atravessou o Rubicão. Lula será preso, não há mais volta para o MPF e para o Juiz Moro.

Mas, isso depende de fazer se acreditar que exista um grave crime sendo cometido, porque há uma enorme fragilidade na argumentação da acusação. Não é em outro sentido o teor da petição do MPF ao juiz Moro para a condução de ações policiais contra o ex-presidente Lula.

Um longo e repetitivo texto de 89 páginas contendo pérolas do tipo:

“Uma análise perfunctória permite visualizar que [a corrupção na Petrobras] se trata de esquema criminoso complexo,… forçoso reconhecer a possibilidade de que essa estrutura delinquente fosse de conhecimento, e até atuasse em benefício, de ocupantes dos mais altos cargos da República.

Se um ex-Ministro de Estado [José Dirceu], que ocupou o cargo no início da década passada, beneficiou-se com o esquema [Dirceu é a encarnação do mal, prescinde-se de provas para condená-lo], não é despropositado aventar a hipótese de que, para manter ativa a estrutura criminosa até o início desta década, houve outras pessoas que, por sua extrema importância econômica, funcional ou política, receberam vantagens indevidas oriundas da corrupção na PETROBRAS.

Nesse sentido, contextualizando os fortes indícios abaixo detalhados … apontam que o ex-presidente da República, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA [LULA], tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”.

De Barbosa a Moro. Aplicaram a Teoria do Domínio do Fato contra Lula, essa é a estratégia para ligá-lo à corrupção na Petrobras e dessa à Lava Jato.

“Se pensas que burlas as normas penais, insuflas, agitas e gritas demais, a lei logo vai te abraçar, infrator, com seus braços de estivador”.

E os tais “fortes indícios abaixo detalhados” são tão somente um compilado de tudo que já foi divulgado pela imprensa no esforço de culpabilização de Lula. E se a imprensa os divulgou, é porque foram vazados pela própria Lava Jato, um a um.

E tome criminalizar as “supostas” palestra e doações pagas pelas empreiteiras envolvidas na Lava Jato. As mesmas que doaram para o Instituto FHC, e para a Folha e para a Globo, só que então eram patrocínios e no caso de Lula propina.

E tome criminalizar a “intrínseca relação do ex-presidente Lula com as empreiteiras que integravam o cartel”. Ele e provavelmente a maioria dos grandes empresários brasileiros  e a totalidade dos presidentes de empresas jornalísticas e dos banqueiros nacionais, além de governadores e ex-presidentes da república.

E tome criminalizar o triplex que é da OAS e o sítio que é dos sócios do filho de Lula, mas que o MPF através de ilações busca fazer crer que sejam de Lula. Entre essas ilações estão o barquinho de lata e até as idas de Dona Marisa à padaria. Não, não é uma ironia, está lá nos itens 99 e 100 da petição do MPF.  Não localizei nada sobre pedalinhos, mas Lula foi questionado sobre isso durante seu interrogatório na Polícia Federal.

E por último, a peça de resistência. A OAS pagou a guarda dos documentos do ex-presidente Lula a um custo de R$ 1.292.210,40 em quatro anos. Detalhe, o contrato da OAS com a Granero inicia-se em 01 de janeiro de 2011. Lula não era mais presidente, mas isso não recebe nenhuma consideração do MPF.

Só em termos de comparação, note-se que o acervo de FHC foi digitalizado em 2009 a um custo de, na época, R$ 5.717.385,94. Mas, aí, mais uma vez, é patrocínio autorizado pela Lei Rouanet. No caso de Lula, é recebimento de vantagens indevidas. E como a OAS é ré na Lava Jato, Lula também passa a ser.

Tudo é muito frágil. Uma fragilidade argumentativa reconhecida, inclusive, no jogo de palavras utilizado tanto pelo Ministério Público Federal quanto pelo juiz Moro.

O Ministério Público na solicitação de autorização acha por bem ponderar:

“Ressalve-se, mesmo sem necessidade, que a medidas investigatórias não representam qualquer conclusão peremptória de que os investigados estão todos de fato envolvidos pessoalmente em ilícitos. Há causa razoável para um olhar mais profundo sobre as comunicações realizadas neste período pelos investigados”.

E o juiz Moro na sua decisão de reafirmar:

“Embora o ex­-Presidente mereça todo o respeito, em virtude da dignidade do cargo que ocupou (sem prejuízo do respeito devido a qualquer pessoa), isso não significa que está imune à investigação”.

O desenrolar dos acontecimentos, o “cerco e captura” de Lula, com a imprensa previamente comunicada e policiais fortemente armados, talvez esperando uma confrontação mortal com o “exército vermelho”, e ridiculamente vestidos com roupas camufladas mesmo para uma atuação em área urbana, deixa claro que não havia nenhuma intenção de demonstrar respeito pelo ex-presidente Lula. Para tanto bastaria a discrição.

O jogo de palavras seria então uma medida preventiva. O que temiam? Justamente a fragilidade da própria argumentação, uma vez que Lula já apresentara contra argumentação consistente sobre todos esses pontos.

Aí entram os mandatos de busca e apreensão e todo o efeito midiático de sua execução. O que buscaria o MPF com esses mandatos? Fatos novos, talvez um telefone celular com uma mensagem de Dona Marisa pedindo duas pizzas pudesse significar recebimento de propina?

“Se tu falas muitas palavras sutis, se gostas de senhas sussurros ardis, a lei tem ouvidos pra te delatar nas pedras do teu próprio lar”.

Pretendia gerar comoção popular.

Quanto à acusação, quem vai dar-se ao trabalho de ler 89 páginas de um texto estéril? Basta brandi-lo e declarar que lá há fortes indícios de culpabilidade de Lula. E o Jornal Nacional destacar pedaços desse texto como se verdades provadas fossem.

O que caberia então ao Juiz Moro, se não uma condenação exemplar e inquestionável?

 “E se definitivamente a sociedade só te tem desprezo e horror, e mesmo nas galeras és nocivo, és um estorvo, és um tumor, a lei fecha o livro, te pregam na cruz, depois chamam os urubus”.

 

 PS1: participação especial de Chico Buarque de Holanda e seu Hino de Duran.

PS2: esta Oficina apoia o Movimento Golpe Nunca Mais.

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